Serviços Prisionais deixaram de assegurar custos dos tratamentos. Ministérios da Saúde e da Justiça não se entendem sobre quem deve pagar.
Há reclusos portadores de VIH e infectados com hepatite C ou B que não fazem qualquer tipo de análises desde Novembro, devido à contenção de custos. Por outro lado, há vários estabelecimentos prisionais que de há três meses para cá não têm acesso a exames de diagnóstico. Estas e outras situações foram relatadas à Abraço - Associação de Apoio a Pessoas com VIH/sida, que denuncia também que a "falta de articulação entre a farmácia dos estabelecimentos prisionais e a do Hospital de Caxias tem levado à ruptura de stocks de alguns medicamentos".Fonte da Abraço disse ao PÚBLICO que foi ordenado o afastamento de infecciologistas em algumas cadeias, "estando os doentes a aguardar que o hospital referenciado pelo Serviço Nacional de Saúde da área do estabelecimento prisional e a direcção do mesmo se entendam quanto à data da marcação de consultas". De acordo com as informações relatadas, "os exames de diagnóstico não estão a realizar-se porque os protocolos entre a Direcção-Geral dos Serviços Prisionais [DGSP] e o SNS não estão activos". Numa nota enviada ao PÚBLICO, a DGSP desmente esta informação, afirmando que "hoje todos os estabelecimentos prisionais têm protocolos com as administrações regionais de saúde", mas nada diz sobre as análises. Também rejeita as acusações sobre a "falta de articulação" entre estabelecimentos prisionais e o Hospital de Caxias, que recebe todos os reclusos doentes que necessitem de cuidados médicos diferenciados, garantindo que "hoje essa articulação é rápida e eficiente, sendo realizada integralmente por via informática".Sobre a dispensa de médicos infecciologistas, a DGSP revela que "os doentes, quando entram no sistema prisional, devem manter-se na consulta da unidade hospitalar do SNS que já frequentavam e onde, aliás, já tinham consultas agendadas". E acrescenta que ,"para uma melhor gestão e racionalização da prestação de cuidados de saúde a reclusos portadores de VIH/sida, foram concentradas algumas especialidades em serviços clínicos de alguns estabelecimentos prisionais".A Abraço alerta ainda para o facto de os reclusos em causa "não serem doentes recém-diagnosticados, mas já em processo de tratamento e acompanhamento, em que alguns necessitam de decisões urgentes quanto à respectiva manutenção ou alteração do seu esquema de tratamento".Quem paga a factura?A despesa anual dos tratamentos é de cerca de oito milhões de euros e foi assegurada, até Julho passado, pela DGSP, sob a tutela do Ministério da Justiça. Porém, com a entrada em vigor do novo Código de Execução de Penas e Medidas Privativas da Liberdade, as cadeias começaram a devolver aos hospitais do SNS que assistem os reclusos e fornecem a medicação a facturação dos medicamentos anti-retrovirais, representando uma transferência de custos para o SNS. O Ministério da Saúde está a trabalhar com o Ministério da Justiça a fim de operacionalizar esta colaboração.O Hospital Joaquim Urbano, no Porto, especializado no tratamento de doenças infecto-contagiosas, é uma das unidades de saúde que presta assistência aos reclusos seropositivos. Em declarações ao PÚBLICO, o director clínico, Rui Sarmento e Castro, confirmou que o hospital continua a receber facturas das cadeias que têm doentes que estão a fazer tratamentos anti-retrovirais, nomeadamente dos estabelecimentos prisionais do Porto (Custóias), Paços de Ferreira, Santa Cruz do Bispo e Izeda. "Aguardamos uma resposta do Ministério da Saúde e da Administração Regional de Saúde do Norte e, sem essas instruções, nada podemos fazer", disse o director clínico, afirmando desconhecer que existam casos de interrupção de tratamentos. Rui Sarmento revelou que o Hospital Joaquim Urbano tem um especialista que vai frequentemente às cadeias de Custóias e de Santa Cruz do Bispo tratar os doentes seropositivos. Já em relação ao Estabelecimento Prisional de Izeda, onde se encontram algumas dezenas de reclusos seropositivos, a opção é idêntica, só que, neste caso, a visita do médico é mais espaçada, acontecendo de 45 em 45 dias. Em meados de Dezembro, o deputado do Bloco de Esquerda João Semedo apresentou no Parlamento um pedido de esclarecimento ao Ministério da Saúde, questionando a ministra Ana Jorge sobre a possibilidade de haver um reforço de verbas para compensar os hospitais pelo acréscimo de despesas. Há dias, aproveitando a presença de Ana Jorge na Assembleia da República, Semedo voltou a abordá-la sobre o mesmo assunto, mas a ministra optou pelo silêncio.
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