11,2% da população carcerária do Estado é feminina, índice maior que o nacional, e a maioria cumpre pena por tráfico de drogas .
O número de mulheres na prisão aumentou 174% nos últimos 5 anos em Mato Grosso. Hoje, elas representam 11,2% da população carcerária do Estado. São 1.264 mulheres para 9.961 homens. O percentual está acima da média nacional, que é de 7,2%.
Em 2005, elas eram apenas 6%. Havia 460 mulheres presas contra 6.661 homens. O crescimento foi 3 vezes maior que a população carcerária masculina, que, de 2005 para 2010, aumentou 49,5%.
Em contrapartida, os investimentos no sistema penitenciário não acompanharam este cenário. Apesar de insuficiente, o número de vagas para homens nas 62 penitenciárias e cadeias do Estado cresceu 30%. De 4.001 há 5 anos, passou para 5.428. Já para as mulheres não houve nenhum investimento na estrutura. O número de vagas é o mesmo. A única penitenciária feminina, a Ana Maria do Couto May, que fica em Cuiabá, tem capacidade para 180 mulheres, mesmo número de 5 anos atrás.
A unidade está com 394 presas, o dobro da capacidade. As outras 872 estão espalhadas no interior. Como nenhum município possui unidades apropriadas para abrigar mulheres, o sistema acaba improvisando estruturas que não são adequadas. Há casos em que elas ficam no mesmo ambiente que os homens. Situação assim foi denunciada na semana passada pela Defensoria Pública. Seis detentas estavam em uma cela da cadeia pública de Alto Araguaia, no mesmo corredor que os homens.
No crime - O crescimento da população carcerária feminina mostra uma triste realidade. Com o título "Da beira do fogão às grades da prisão", a mestra em Serviço Social da Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT), Vera Bertoline, explicou, em um artigo, que isso ocorre porque as mulheres estão se inserindo cada vez mais no universo masculino, e neste "universo" também estão o consumo de álcool, drogas e participação em crimes. "As mulheres conquistaram novos espaços de atuação no mundo público. Porém, a partir destas conquistas, tem-se observado, por parte delas, a reprodução de comportamentos e atitudes até então tidos e aceitos socialmente como do mundo masculino".
Jovens, saudáveis e vaidosas. Na penitenciária Ana Maria Couto, 50% das encarceradas têm entre 18 e 29 anos. As com 30 a 45 anos somam 34%. O restante tem entre 46 e 60 anos. A escolaridade é baixa. A maioria delas, 48%, tem o ensino fundamental incompleto e 30% são alfabetizadas. Apenas 12% tem o ensino fundamental completo e 9% conseguiram chegar ao ensino médio.
Uma pesquisa concluída no ano passado pelo Núcleo de Estudos sobre a Violência e a Cidadania, da UFMT, elencou outras características das mulheres que estão detidas na unidade. Na época, a maioria (59%) era parda, 18% negras e 17% brancas. Apenas 32% declaram ser naturais de outros Estados. As outras 68% eram mato-grossenses, sendo 36% nascidas em Cuiabá.
Das entrevistadas, 39% estavam presas por envolvimento com o tráfico de drogas. Outras 13% por furto, 7% por roubo, 6% por homicídio e 20% pelos crimes de falsidade ideológica, receptação e latrocínio. "Percebemos que a maioria foi presa por envolvimento com drogas. Mas, apesar desta realidade, pouco tem sido feito para entender porque estas mulheres entram no tráfico".
Sobrevivência - A boliviana Margarita, 39, foi presa ao entrar em Mato Grosso com 1 quilo de pasta-base. Ela conta que receberia R$ 1 mil para fazer o serviço, dinheiro que seria utilizado para sustentar os 5 filhos, todos menores. "Eu precisava. Estava desempregada e sem dinheiro para nada. Então, aceitei fazer o serviço".
Quando ela saiu da Bolívia deixou os filhos - um casal de gêmeos de 3 anos, um de 7, outro de 10 e o mais velho de 13 anos - com o avô. Desde então, não tem notícias da família. "Não sei como eles estão. Não vejo a hora de sair daqui e rever meus pequenos, estou com coração apertado".
A história de Margarita é a mesma de outras 23 bolivianas que estão na unidade.
Abandono - Ao entrar na unidade, muitas dessas mulheres são esquecidas pelo marido e familiares. De acordo com a direção, nas visitas, que ocorrem aos sábados e domingos, a média é de 150 visitantes. Desses, 75 são mulheres, 45 crianças e, apenas, 35 são homens. "Realidade bem diferente da que vemos nos presídios masculinos, que sempre ficam lotados de mulheres e crianças", relatou a diretora da unidade, Fabiana Maria Auxiliadora da Silva Soares.
Segundo ela, as desigualdades no tratamento das mulheres encarceradas começam nas visitas íntimas. Hoje, apenas 18 se encontram com os maridos semanalmente. "Nós entramos com pedido no Judiciário e conseguimos autorização para que as mulheres recebam visitas íntimas nas celas. Só não autorizamos ainda porque estamos fazendo as adaptações necessárias".
Um dos reflexos da ausência das visitas, segundo Fabiana, é o aumento das relações homossexuais entre as detentas.
Trabalho e lazer - Para compensar o abandono, as encarceradas são envolvidas em diversas atividades. Elas podem participar de aulas, frequentar o salão de beleza montado em uma das celas, e têm direito a uma ligação por semana para a família.
Ainda, no sistema "cela livre", elas podem trabalhar e ter redução da pena. Elas ficam das 7h às 17h trabalhando e, somente à noite, retornam para as celas. Para cada 3 dias de serviço, é 1 dia a menos de pena.
Algumas trabalham no setor administrativo, como E.L, de 21 anos. Ela foi presa com a mãe acusada de envolvimento com tráfico e, por causa do bom comportamento, foi chamada para ajudar no setor administrativo da unidade.
Apesar de contar os dias para sair da unidade, a jovem confessa que terá motivos para sentir saudade. "Eu sei que estou aqui injustamente, mas aprendi muitas coisas e aprendi a gostar de muitas pessoas, que terei saudades".
São elas também que fazem a própria comida, limpam, cuidam da creche, da horta, e ainda trabalham na fabricação de salgados, bolsas e sala de costura. "Estamos com outro projeto para uma fábrica de roupas, já que muitas chegam aqui grávidas e não têm roupas para os bebês. Então, elas mesmas poderão costurar", relatou a diretora.
Gravidez - Muitas não chegam na unidade sozinhas, mas acompanhadas dos futuros filhos. De acordo com a direção, em média, 8 a 10 mulheres grávidas são detidas. É o caso de Patrícia, 23. Quando ela foi presa estava grávida de 2 meses. Hoje, de 5 meses, ela está na expectativa de conseguir a liberdade e ter o filho em casa.
Patrícia foi presa com o marido, acusado de tráfico. Ela conta que, mesmo sabendo que ele comercializava drogas, aceitou morar com o mesmo. "Meu pai não queria que eu continuasse com ele, mas eu gosto do meu marido".
Ela confessa que ao sair da prisão, pretende visitar o companheiro preso. "Ele é o pai do meu filho. Vou visitá-lo e depois que tiver o bebe levar para ele conhecer".
Luciana também chegou na prisão grávida. Hoje, o filho que teve na cadeia de Cáceres, onde ela ficou detida nos primeiros meses, está com 2 anos e passa os dias na creche da penitenciária, junto com outras 44 crianças. Parte do tempo ele fica ao lado da mãe. "Eu fui condenada a 6 anos de prisão, mas vou cumprir só dois quartos aqui. Logo logo vamos sair".
A diretora da unidade destaca que as crianças passam o dia todo na creche e, à noite, dormem com a mãe. Quando pequenos, são acompanhados pelas mães o tempo integral. As crianças ficam na unidade até os 2 anos, depois são encaminhadas para a família da presa.
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